O contexto no qual a doula se insere é o do Parto Humanizado.
O Parto Humanizado (que não é um tipo de parto) consiste, em primeiro lugar, em
restituir à mulher o protagonismo do seu parto (1).
Se a mulher se sente mais segura parindo no hospital, deve
ser assegurado a ela o direito de parir no hospital. Por outro lado, se prefere
ter seu filho em casa, seu direito também deve ser respeitado. Se a mulher
acredita que pode não suportar a dor até o nascimento do bebê e gostaria de ter
anestesia disponível, assim será. O mesmo acontece para todos os demais
aspectos relacionados ao parto: autorização para que seja feita episiotomia, escolha
livre de posições durante o trabalho de parto e parto, recusa de procedimentos
violentos no recém nascido (tais quais uso de colírio de nitrato de prata,
aspiração das vias aéreas, aspiração gástrica etc).
Todos os desejos da gestante podem ser explicitados através
de um documento chamado Plano de Parto, que a mulher pode elaborar junto com
seu obstetra ou sua doula, que podem oferecer mais informações e esclarecer
eventuais dúvidas sobre todo o processo de pré-parto, parto e pós-parto para
que, quando chegar a hora, a mulher não precise se preocupar em estar racional
pois terá a certeza de ser atendida conforme sua vontade, desde que tudo esteja
correndo bem, podendo se entregar completamente ao nascimento do seu bebê.
A conduta dos profissionais da humanização do parto está
sempre vinculada à Medicina Baseada em Evidências (2). Espantosamente, apenas
10% dos procedimentos de um parto hospitalar comum, tem embasamento científico
sólido para serem realizados. Uso de máscara, roupa cirúrgica, campo, raspagem
dos pelos (tricotomia), corte do períneo (episiotomia), lavagem intestinal
(enema), posição horizontal (posição de litotomia)... Nada, N-A-D-A disso tem
base científica para ser utilizado e, ainda, as pesquisas já apontam claramente
o oposto, apontam que não devem ser feitos.
Com uma equipe vinculada à Medicina Baseada em Evidências, certamente
apenas procedimentos seguros e necessários serão realizados.
Uma das grandes lutas do Parto Humanizado é para que as
cesarianas deixem de ser feitas como rotina, como tem sido feito no Brasil nas
últimas décadas, e passem a ser utilizadas exclusivamente para sua finalidade:
salvar a vida da mãe ou do bebê. O risco dessa cirurgia abdominal de grande
porte é muito alto quando comparado ao de um parto vaginal e não deve, em
hipótese alguma, ser feito sem necessidade. A cesariana é segura quando é
melhor para a mãe ou para o bebê que o bebê saia logo do útero. A cesariana não
é uma “alternativa equivalente ao parto espontâneo” (3).
Não é admissível UTIs neo-natais lotadas de bebês
prematuros, mulheres perdendo útero ou morrendo em decorrência de um
procedimento cirúrgico realizado sem real indicação.
As indicações reais para cesariana são poucas e bem
específicas (abordarei em outro post). A Organização Mundial da Saúde recomenda
que a taxa de cada médico não ultrapasse 15% do total de partos, porcentagem
que cobre única e exclusivamente as cesarianas necessárias.
É nosso papel, inclusive, ajudar a desmistificar as
indicações fictícias que têm levado tantas mulheres para cesariana nos últimos
anos (falta de dilatação, sobrepeso materno, bacia estreita, bebê grande, bebê
pequeno, muito/pouco líquido amniótico, “sofrimento fetal... Ah, são tantos...).
Lembrando que”, no Brasil, no início da gestação 70% das mulheres querem ter um
parto normal, mas no final pouquíssimas conseguem pois sempre acontece algo que
a faça mudar de idéia, geralmente comentários e atitudes do obstetra que acabam
minando seu desejo e desencorajando.
Entendemos toda conduta que vá contra a vontade da mulher,
bem estar (real) do binômio mãe-bebê e Medicina Baseada em Evidências, são
violências, ainda que veladas ou tão comuns que as pessoas acreditem que seja o
“normal”.
Nossa luta é para que em um futuro próximo as mulheres que
querem parir, possam fazê-lo do seu jeito, seguindo suas regras, sempre com uma
equipe de qualidade pronta para intervir em qualquer eventualidade.
(1)
Jones, Ricardo. “Entre as orelhas: histórias de parto”,
Idéias a Granel, 2ª Edição, p. 223.
(4)
http://portal.fiocruz.br/pt-br/content/pesquisa-revela-numero-excessivo-de-cesarianas-no-pais